quinta-feira, junho 26, 2008

MALACA, REDUTO DE UMA PRESENÇA PERDIDA NO TEMPO


Depois de, nestas páginas, me referir à Malásia e ao orgulho de a ter visitado, mal parecia não tecer também algumas impressões acerca de Malaca, do que foi no passado, do que é hoje e do que representou para Portugal no contexto da gesta descobridora do século XVI.

MALACA é um dos estados mais pequenos do conjunto de estados e sultanatos que compõem o actual Estado da Malásia. Situado na parte meridional da Península Malaia e com uma população de 760 000 habitantes, Malaca já foi um sultanato durante séculos governado por um Sultão, mas hoje é um dos 4 estados que se encontram a ser politicamente administrados por um Governador oriundo de eleições livres. Integrante de uma Monarquia Constitucional, Malaca não sendo, como disse, nos tempos que correm, o reino de um só Sultão, é o Estado de um Governador eleito por períodos de quatros anos.

Principal ponto de passagem marítimo entre os oceanos Índico e Pacífico, polo estratégico de uma região onde se cruzavam actividades comerciais provenientes das regiões mais prósperas daquela parcela do mundo, Malaca foi sempre, desde tempos remotos, muito cobiçada por reis, sultões, militares e comerciantes. Fundada por Parameswara no ano de 1400, Malaca cedo se transformou num grande porto comercial e depressa passou a ser um dos pontos de referência de um Sultanato próspero, que se permitia dominar toda a região e atrair a si o grande comércio mundial da época. No auge da sua pujança económica Malaca era, na verdade, um sultanato poderoso que controlava todo o sul da Península Malaia, grande parte da Ilha de Sumatra e todo o comércio que, proveniente do oriente e do ocidente, cruzava obrigatoriamente aquele incontornável entreposto comercial do mundo de então.

Não foi surpresa, por isso, que Afonso de Albuquerque desde cedo se apercebesse da importância estratégica de Malaca e a conquistasse para o Reino de Portugal no dia 1 de Julho do ano de 1511, permanecendo portuguesa até 1641. A partir desta data, e até 1795, foi dominada pelos Holandeses que, por sua vez, a cederam pelo tratado Anglo-Neerlandês à Coroa Britânica em 1824. Parte territorial daquela Coroa, controlada e gerida pela Companhia Britânica das Índias Orientais, assim se manteve até à proclamação da Independência da Malásia em 1957, a cujo novo País começou definitivamente a fazer parte integrante.

As poucas horas que passei em Malaca deram facilmente para perceber, quinhentos anos depois da sua conquista por Diogo Lopes Sequeira e Afonso de Albuquerque, que houve portugueses que passaram por lá e que por lá permaneceram durante 130 anos. A primeira presença portuguesa ocorreu no dia 11 de Setembro de 1500 através do navegador Diogo Lopes Sequeira. A sua conquista efectiva para a Coroa portuguesa de D. Manuel I foi operada por Afonso de Albuquerque onze anos depois, exactamente no dia 1 de Julho de 1511.

São hoje claros os vestígios da presença portuguesa. Desde logo por haver quem ainda naquele local entenda o português; por ainda haver quem seja capaz de soletrar a nossa língua; por ainda haver quem utilize a culinária do nosso País; por ainda haver quem dedilhe a guitarra e cante o folclore de Portugal; por ainda haver quem comemore as festas dos santos populares; por ainda haver quem adopte nomes de origem portuguesa para os seus restaurantes, para as ruas da sua cidade, para os nomes e apelidos das pessoas que constituem a sua própria comunidade. Parece impossível mas tudo isso é ainda hoje verdade, várias dezenas de gerações depois da primeira presença de portugueses naquela região da Ásia oriental. Tudo isso eu vi, tudo isso eu senti quando lá estive há duas semanas atrás. Falei em português e fui compreendido; escrevi em português e fui percebido; corrigi frases mal escritas de um português com erros e as pessoas agradeceram. Foram duas horas de um diálogo intenso que emocionou, dum diálogo que nunca mais vou esquecer. Como vou recordar para sempre aquele malaio de tez escura, simpático, poliglota, amável, comovido e ainda com a esperança vaga de um dia poder ver com os seus próprios olhos o chão de uma pátria que remotamente o predestinou para ser agora um malaio de origem portuguesa!!! Se eu fosse um homem rico ter-lhe-ia proporcionado esse seu desejo comovedor….Que dirão a isto os políticos que hoje governam Portugal? Nada.
MALÁSIA, UMA AGRADÁVEL SURPRESA


Nunca imaginei que, aos olhos de um europeu distante da realidade asiática, a Malásia pudesse já ter o estado de desenvolvimento económico e social que me foi dado observar pessoalmente durante os quatro dias de férias que lá passei há duas semanas atrás. Apreciei as suas belezas naturais, impressionou-me a sua pujança económica, surpreendeu-me a sua organização política, agradou-me o convívio sadio das etnias que compõem aquele jovem Estado.

A Malásia é, desde 1957, uma monarquia constitucional composta por 13 estados, dos quais 9 são sultanatos regidos por um sultão, e 4 são territórios governados, durante 4 anos, por um governador saído de eleições democráticas. Se o poder do dia a dia está nas mãos de um Primeiro-ministro escolhido pelo povo em eleições livres, o verdadeiro símbolo da soberania malaia é essencialmente a figura do Rei. Dum Rei que, ao contrário do que é habitual nas monarquias tradicionais, não é um rei para toda a vida; dum rei que o é apenas pelo período de 5 anos, em sistema de rotação e depois de eleito dentre cada um dos sultões que reinam nos 9 sultanatos da Malásia. Se o Rei, o Primeiro-ministro, o Parlamento e os Tribunais representam, na Malásia, os poderes clássicos de uma qualquer monarquia constitucional ou de um Estado Republicano, o Rei e o Primeiro Ministro são, na prática, os que detêm maior visibilidade e o poder efectivo do dia a dia: o primeiro como símbolo nacional e internacional da própria soberania malaia, o segundo como símbolo do poder efectivo, daquele poder que, de facto, mexe com o País e bole com as populações.

A Malásia é, no concerto de uma economia global, um País rico. O turismo, os recursos naturais (a Malásia é o maior produtor mundial de estanho), os produtos agrícolas (primeiro produtor mundial de borracha e óleo de palma), os produtos manufacturados e especialmente o petróleo são a base de uma economia sólida que se tem vindo a sustentar nas relações comerciais que os diversos governos souberam desenvolver com perfeição com os Estados Unidos da América, a República Popular da China, o Japão e os chamados tigres asiáticos. A Malásia tem recursos próprios, cultiva-os, acrescenta-lhes valor e sabe vendê-los na perfeição ao mundo em geral e àqueles países em particular.

Kuala Lumpur, capital da Malásia, é uma cidade de dois milhões de habitantes que impressiona pelo bulício das suas actividades, pela sumptuosidade dos edifícios modernos que por ela se espalham, pela imponência das suas Torres Gémeas e da Torre Menara, pela grandiosidade dos seus monumentos, templos, mesquitas e palácios, pela grandiloquência dos seus arranha-céus, pelos sinais de uma economia que fervilha por toda a parte, pela tranquilidade afável das suas populações multiétnicas. Kuala Lumpur é uma grande metrópole do oriente asiático que se manifesta, desde logo para quem lá chega, pela imponência acolhedora do seu próprio aeroporto internacional.

Independentemente do que atrás se descreve, e que é do domínio comum, há outros aspectos peculiares de que não posso deixar de realçar um ou outro. É, por exemplo, o caso das três principais etnias que por lá coexistem pacificamente e é o caso três religiões que aí se praticam. A etnia malaia, a etnia chinesa e a etnia hindu constituem a base da população da actual Malásia numa relação aproximada de 60%, 30% e 10%, respectivamente, e em que a prática da religião se faz exactamente na mesma proporção de culto.

Se a religião oficial do Estado é uma religião islâmica de saudável tolerância, o budismo dos chineses ou o hinduísmo das populações indianos são também religiões que se praticam ao longo do Estado malaio sem nenhuma espécie de dificuldade. Mesquitas, templos budistas e templos hindus coexistem, por isso, lado a lado, sem nenhuma ponta de hostilização de quem os frequenta. Apesar de tudo quem for um fiel de Maomé tem outras possibilidades: o emprego é mais fácil e rápido dado que é obrigatório que todas as empresas empreguem, pelo menos, 30% do total de postos de trabalho. E se alguém não for muçulmano e quiser contrair matrimónio com uma pessoa muçulmana só o poderá fazer se se converter previamente à religião do profeta Maomé; se não o fizer fica legalmente impedido de se casar. É uma lei civil ainda fortemente coagida pelas imposições oficiais de um Corão que, apesar de tudo, é muito mais tolerante por aquelas bandas do que o é por outros países de cultura e religião igualmente islâmicos.

Gostei de ter ido à Malásia, gostei de ter convivido de perto com as suas populações, emocionei-me especialmente com o facto de em Malaca, passados que foram cinco séculos, ainda haver quem por ali compreenda o português. Por isso, hei-de lá voltar de novo.

terça-feira, junho 24, 2008

MACAU, A CIDADE DE LAS VEGAS DO ORIENTE


Nos últimos vinte anos visitei Macau por cinco vezes, tendo a última visita ocorrido há duas semanas. Que diferença, senhores, entre o que vi da primeira vez que lá estive na década de oitenta e o que agora vi na primeira década do século vinte e um. Não há comparação possível. De cada vez que lá ia, via diferenças. Desta vez as diferenças foram avassaladoras. Duma pequeno território que no início conheci, atrasado, burlesco e muito mal visto por turistas e chineses que o demandavam, passou-se para uma Região Administrativa Especial da República Popular da China, moderna, sumptuosa, rica, pujante de actividade, cosmopolita.

Sem se querer fazer aqui a sua história, a bem dizer poderemos hoje falar de Macau como território de administração portuguesa antes do Governador Carlos Melancia, de um território da eras Melancia e Rocha Vieira, e de uma Região Administrativa Especial de Edmundo Ho depois da sua integração, em 1999, na República Popular da China.

Independentemente de um clima de corrupção generalizado que por lá se viveu durante o consulado do Governador Carlos Melancia, e que fizeram as delícias dos jornais sensacionalistas da época, há que ser-se justo, reconhecendo que foi especialmente no tempo deste Governador que foram dados os passos decisivos para a transformação do que Macau é nesta primeira década do século vinte e um. Melancia foi frenético, teve uma ideia para este território, deu-lhe visão estratégica, concebeu-lhe os grandes projectos infra-estruturais, dotou-o dos primeiros casinos e preparou-o para poder ser um dos grandes pólos regionais e mundiais do jogo e do turismo. Se Carlos Melancia teve uma ideia e um projecto de desenvolvimento a longo prazo para Macau, o General Rocha Vieira foi capaz de o seguir, exprimindo com obras, com infra-estruturas e com desenvolvimento económico as ideias-mestras do seu antecessor. Sem a visão estratégica de Carlos Melancia e a gestão tranquila de Rocha Vieira dificilmente Macau teria tido condições para ser hoje uma espécie de LAS VEGAS do oriente asiático. O sentimento que tive quando visitei, há duas semanas, Macau e as ilhas de Taipa e Coloane foi, de facto, o de que estava num mundo novo, onde se respirava jogo e dinheiro por todos os lados. Hotéis e mais Hotéis, Casinos e mais Casinos, uns sumptuosamente funcionais, outros ainda em fase acelerada de construção.

Há duas ou três ideias-chave que passarei a recordar desta visita relâmpago a Macau. O Chinês e o Inglês são as línguas de comunicação corrente, e o português mal se fala, embora se veja ainda escrito nas ruas e nos monumentos de expressão portuguesa. Com uma população residente de pouco mais de quinhentas mil pessoas e uma média de trinta milhões de turistas que visitam esta Região por ano, Macau, tal como Hong Kong e Singapura, é hoje um dos grandes centros económicos do longínquo oriente da Ásia. Vive do jogo e para o jogo e, nesse domínio, pede meças à grande metrópole americana do jogo e dos casinos. Quem entra em Macau, pelas Portas do Cerco, pelo Aeroporto Internacional ou pelos barcos provenientes de Hong Kong, é gratuitamente conduzido por shuttle-buses para o seu Hotel-Casino para poder jogar. Cada Hotel é um casino, cada casino funciona ininterruptamente 24 horas por dia, e em cada casino há espectáculos, snack e bebidas gratuitas para que o jogador se mantenha a jogar o maior número de horas que for lhe possível.

Gostei de Macau, gostei de lá ter ido, apreciei a sua pujança económica, gostei das suas gentes, senti que, apesar de tudo, ainda há por lá um bocado de todos nós, um pedaço de Portugal. As Ruínas de S. Paulo, a gruta de Camões, a Fortaleza do Monte e o Farol da Guia são, dentre muitas outras, ilustrações reveladoras.

quinta-feira, junho 19, 2008

BYE-BYE, SENHOR FILIPE SCOLARI


Portugal perdeu o jogo com a Alemanha por 3-2 mas perdeu muito mal. Se foi mal batido nos três golos, o modo como sofreu o terceiro foi absolutamente inaceitável. O guarda-redes português ficou muito mal na fotografia, independentemente de o golo ser precedido de falta ou não. Houve, de facto, falta sobre Paulo Ferreira, mas Ricardo, na sua área de intervenção, tinha que controlar a bola antes de a mesma ser cabeceada com êxito pelo avançado alemão. Se Ricardo Ferreira já tinha tido responsabilidades na perda de um campeonato por parte do Sporting Clube de Portugal (não chegou à bola com as mãos onde Luisão “tropeçou” com cabeça…) também o seu desempenho como guarda-redes da selecção nacional ficará, para sempre, ligado às derrotas do meu País no EURO de 2004 e agora no de 2008. Excelente dentro da baliza foi sempre um desastre ao sair dela. Altamente protegido e apaparicado por Scolari e por uma certa imprensa de Lisboa, Ricardo Ferreira nunca foi o guarda-redes de que Portugal precisava. Nem ele, nem Petit, nem Nuno Gomes. O resultado é o que se vê, uma profunda desilusão.

Luís Filipe Scolari passou pelo futebol português sem glória. Quase que ganhava tudo mas acabou por não ganhar absolutamente nada. Para o que fez, qualquer treinador de qualidade média fazia o mesmo, a menor custo e sem dividir os portugueses. Ainda bem que se vai embora. O futuro dele à frente do Chelsea provará que não passa de um grande bluff.

Scolari nunca foi um seleccionador isento e, por vezes, fez dos portugueses uma gente menor. Não gostei que o símbolo do meu País tivesse sido por ele usado ao serviço dos seus intentos pessoais e sempre detestei a forma como tratou o melhor clube português dos últimos vinte anos. Ainda está por explicar a exclusão de Vítor Baía do EURO 2004 e nunca se entendeu a provocação que lhe foi feita, bem como ao Futebol Clube do Porto, de se ter permitido convocar o terceiro guarda-redes deste clube para os trabalhos da selecção no período de preparação para aquele torneio internacional.

Um seleccionador nacional nunca pode ter o comportamento que teve no fim do jogo com a Sérvia, revelando mau perder e “cumprimentando a soco” um dos atletas adversários. Um seleccionador nacional, em pleno campeonato da Europa de 2008, nunca deve vir a público com a notícia de que já tinha celebrado contrato com uma nova equipa de futebol. Ao tê-lo feito traiu a entidade patronal que lhe pagava, humilhou os portugueses e deu-se ao desplante de ser um mau exemplo para os próprios atletas que dirigia. Desde que fez esse anúncio, por coincidência ou não, Portugal nunca mais ganhou um jogo do Euro: perdeu com a Suíça e perdeu hoje com a selecção da Alemanha.

Scolari vai-se embora e ainda bem que vai. Não ganhou nada, não foi isento, dividiu os portugueses, teve comportamentos reprováveis e, em termos de carácter, deixou muito a desejar. Parte sem glória e não deixa saudades. Que seja muito feliz e que outros o queiram aturar…